05 agosto 2007

11-Diário Não-ficcional Rússia - Julho/07

Dia 10, não foi dessa vez.

Hoje o dia seria um pouco diferente. Logo depois das atividades comuns, como ginástica matinal e café da manhã, os jovens receberam uma palestra sobre resolução de conflitos.

O grupo foi dividido em pares. No primeiro exercício um dos jovens fecharia a mão e o outro tentaria abri-la usando qualquer meio possível. Todos dentro de um círculo imaginário e a brincadeira começou. Alguns se esforçam para abrir a mão do outro, enquanto o outro se esforça para não deixar isso acontecer. Mesmo sem nenhuma instrução explicita uma dupla não se agitava, mas negociaram e resolverem esse conflito. Essa dupla era formada por um garoto e uma garota e, inicialmente, o garoto era quem fechava a mão. Exercício terminado, então vamos fazer ao contrário, novamente, muito esforço de quase todos e o mesmo casal continuava conversando. Tempo esgotado e a garota não abriu a mão. O instrutor perguntou para todos como foi o exercício e a única coisa que o garoto respondeu é que "Essa mulher é muito difícil", não amigo, todas elas são.

O próximo exercício faria jus a qualquer programa de seleção de RH. Um avião caiu em um deserto. Você tem 15 itens para levar com você, itens como: Água, faca, óculos, lanternas, capas de chuva, cobertores, ... e Vodka. Cada um fez sua lista de prioridade, baseada nos itens disponíveis. Segunda parte do exercício. Sentem em pares e tentem montar uma lista em conjunto. OK, salvo algumas discussões tudo correu bem. Agora o grupo todo. São dezesseis adolescentes que falam, ao mesmo tempo, e querem coisas diferentes. Demorou um pouquinho e um, ou outro, ás vezes,  tinha que gritar alguma palavra de ordem. O divertido foi perceber que na lista dos meninos a Vodka estava entre os cinco últimos itens, mas nos das meninas estavam entre os cinco primeiros. E depois são os homens que bebem?

Logo depois do almoço, os adolescentes teriam aula de inglês e resolvi passear pelas redondezas. Não imaginava que estava tão próximo do centro. Passei pelo Aurora (Navio que anunciou que a revolução proletariado estava começando), continuei andando, observando, por algumas horas, e cansado voltei para o Hotel. No Hotel ainda tive tempo de conhecer o professor de Inglês. Alan, um inglês com cara de gringo (sacou?) e que morou um ano no Brasil. Não fala mais português, mas conhece um pouco de nossa música. Disse que saiu do Brasil porque era muito quente. Porra! saiu do Brasil porque é muito quente e vem para a Rússia? Bom, acho que esse é o humor inglês - Se for, não entendi a piada.

Hora do Jantar e como sempre, sentei-me com os instrutores e com alguns adolescentes. No final do jantar, começamos a falar sobre trivialidades e sobre as novelas brasileiras. Tudo bem, respondi o que poderia lembrar e fim do jantar. Assim que me preparava para subir para a última atividade do dia, com os jovens, fui convidado à mesa de uns colegas de trabalho. Aceitei o convite e sentei-me. Reparei que todos o três colegas da mesa riam muito, quase que histericamente, mas como havia acabado de me sentar, resolvi esperar a "poeira baixar", mas ela não abaixou. A primeira pergunta que foi feita a mim foi: "Você estava falando sobre cultura Brasileira com os instrutores? Estava discutindo as novelas Brasileiras?", e mais risos. Não quis ser mal educado e falei que, também, estava conversando sobre isso. Continuaram a rir e a fazer outras perguntas cretinas sobre o Brasil. E eu pensando: "Ok, até aonde isso vai? Porque que vou me estressar se o Brasileiro, aqui, esta aqui e sem pagar nada?". Lá pelas tantas acabei dizendo algumas, que resumidamente foi: "Para nós, brasileiros, na Rússia só tem bêbado!" Pronto! A atenção que queria. Reconheço que quando Czares russos já fornicavam por aqui, o Brasil nem havia sido descoberto e reconheço que ainda sei muito pouco sobre a Rússia. Temos estereótipos de todas as culturas e não me irrita quando ouço de um estrangeiro que "No Brasil ninguém trabalha e tem carnaval o ano todo". Para que vou me estressar. Respondo educadamente que essa informação é incorreta e puxo um papo sobre o Brasil. Sim, o Brasileiro festeja e pula carnaval? Sim e ainda bem, mas achar que só fazemos isso no Brasil é demais, não? Também votamos errado e temos memória curta, mas isso eu não conto para os gringos.

Perguntaram se iríamos fazer [no Brasil] um Summer Camp e se alguém da Rússia seria convidado. Eu disse que esperava que sim e que todos eram bem vindos, porém, uma colega dispara: "Mas para que?". Repondo que aparentemente para nada, já que é isso que estou fazendo por aqui. Levanto-me e vou ajudar os adolescentes.

Fui convidado para participar dessa primeira edição do Summer Camp, organizado pela filial Russa da multinacional em que trabalho. Gostei da idéia e nem parei para pensar sobre o que isso significava, já que, quase, toda experiência é válida. Não falo russo e não participei do desenvolvimento do projeto, mas sei me comunicar, quando quero. Vim para cá com o objetivo de fazer os adolescentes se divertirem e isso, posso dizer sem modéstia alguma, que estou conseguindo. Quase sempre sou citado nos mini-projetos deles e nos seus agradecimentos diários. Reparei que uma russa não gostou muito disso, mas não fiz a menor questão de evitar isso. Talvez por isso ouvi um "Mas para que ?". Mais tarde a pessoa responsável pelo projeto, e que estava na mesa, veio até mim e pediu desculpas. Eu? Estressar com isso?

Depois de desejar Boa noite aos adolescentes do meu grupo. Fui andar pela Margem do rio com Tatyana. Escovei os dentes, lavei a cara e lá fui eu. Levei uma blusa de lã, pois São Petersburgo é fria, á noite, e venta na maior parte do tempo. Tatyana estava com as mesmas calças jeans e camiseta do dia, como eu, e havia colocado uma blusa, como eu. Assim que chegamos a margem do rio, eu comecei o "ataque".

Desde que a vi, pela primeira vez, algo aconteceu. Nossos olhares se cruzam com uma boa freqüência (mas isso não impediu que eu errasse: Seus olhos são verdes - Mas parecem azuis), entre sorrisos e gostos em comum, descobertos nestes últimos dias.

Já sabia que ela fizera algumas viagens, pelo mundo, com o namorado, mas ainda não sabia se era o namorado o ex-namorado. Sem perder tempo, perguntei se alguém a esperava em Moscou e ela entendeu o que quis dizer. Fui além e perguntei quem. "Um homem", ela responde. Acho que o mundo girou um pouco mais rápido, naquela hora, pois senti meus joelhos dobrarem um pouco, sem que eu solicitasse. Ok Ok, calma! Provavelmente eu deveria recuar e falar sobre a vida como ela é e pensar na próxima. Mas como se faz isso quando você vê em um o que não vê nos outros? Ela é especial. Tatyana é de pouca fala, mas aqueles grandes olhos verdes dizem muito. Não recuei. Ela disse para irmos em direção ao Aurora. No meio do caminho, sentamo-nos na beira do Rio, juntinhos, enquanto admirávamos o Aurora e a luz da lua refletida na ondas feitas pelas pequenas embarcações. Abracei-a, pois, além de uma leve chuva friorenta ter começado, eu queria ficar mais próximo a ela. Ela permitiu.

Juntos, passei a falar sobre a vida no Brasil e da nossa poesia. Infelizmente a única poesia que poderia recitar é "Ismália" de Alphonsos de Guimarães, que pode até soar bonitinha aos ouvidos de quem, ainda, não fala português, mas quando fosse obrigado a traduzi-la, certamente destruiria o clima, pois alguém me diga quem iria querer ouvir sobre uma jovem louca que se matou? Música é poesia com ritmo e engatei cantando um "Samba da Benção" (Deus abençoe Vinicius de Morais) seguido por um "Preta Pretinha", que fez Tatyana se derreter toda nos meus Braços. Deus abençoe os novos e velhos baianos. Abracei-a ainda mais forte e deixei seu corpo o mais próximo que pude. A mão livre fazia cafuné e descobria a sua nuca, que logo seria coberta com alguns beijinhos. Ela aceitava, mas nada falava. Fui virando seu rosto e senti, seu nariz, gelado, em meu pescoço, depois nas minhas bochechas e, agora era hora, iria consumar o ponto, para o time dos meninos e ÁGUAAAAAAA! Tatyana virou o rosto e me abraçou forte.

Puta que o Paril!

Ficamos mais um bom tempo abraçados e conversamos. Voltamos para o Hotel, abraçados e calados. Ela entende, como eu, que devemos fazer o melhor que pudermos com o que sabemos. Eu fiz e ela fez. Antes de dormir, liguei o IPOD e fiquei ouvindo música até altas horas. Talvez tenha adormecido por volta das 3h.

Não sei.

Paká


2 comentários:

Julia Cotrim disse...

Ponto para as meninas!! Hahaha

Joao Costa disse...

Hey,
you should be on my side!